quinta-feira, 15 de abril de 2010

Não é raça e sim, poder!

Quando pensamos em escravos, lembramos dos livros de história dos colégios com aquelas fotos de negros amarrados a um pau de sebo, curtindo as chicotadas enviadas pelos bem vestidos homens de branco. Talvez pela minha educação branca (?), sempre tive a sensação de que os negros escravos eram homens que mereciam aquelas chicotadas por terem feito algo muito, muito ruim. A verdade é que, se eu refletisse sobre aquela cena, pensaria que talvez, muito remotamente, meus zazaravôs podiam ser descendentes do ramo que descia a chibata e não daquele que sentia o sangue descer das costas. Dizem que se batiam muito nos negros para que o sangue chegasse a pingar no chão, já que a rubra cor confundia-se com a negra pele dos escravos.
Tenho a cor da pele clara, nasci com os cabelos escorridíssimos e pálidos. E somente por isso passava na minha cabecinha que eu vim de fora e não era uma selvagem. Ninguém me disse que tenho o sangue daqueles que sofreram por não se entregarem à escravidão e por ela, padeceram. Acordei assim meio de repente, dando-me conta da minha origem negra. E olhando pra minha pele cheguei a encontrar pigmentos nada alvos sob a brancura de quem não vai mais à praia. Conclui que a cor da pele está dentro dos olhos de quem a vê. E não tem essa de sangue puro não, somos todos mestiços. Tenho alguns zililitros de sangue sofredor aqui. Dá pra perceber a dificuldade que temos em assumir isto. Hoje ainda temos uma resistência branca tupi-europeia que impede a luta dos nossos Dragões do Mar e Almirantes Negros? A questão não é de raça, pedigree ou essas coisas... A questão é o poder! Neste caso, vinculado à origem pela cor da pele. Outro dia, assisti um capítulo daqueles realitys, acho que era America's Next Top Model, onde as candidatas ao título ficam, durante o período dos testes, confinadas ao mesmo teto, enfim, lá vem, mulheres juntas, competição pelo cobiçadíssimo título, TPMs coletivas, ciúmes das chapinhas...A única participante negra do programa justificou que sua bronca com uma outra lá dizendo: "Sonho em ter duas empregadas na minha casa, duas loiras cozinhando pra mim!". Pronto, agora é vingança. Como não sou negra, não tenho na pele, a ideia do que é ser discriminada por este motivo. Estamos dispostos a pintar nossa própria pele de uma cor mais escura e continuarmos felizes? Não somos ainda escravos de algum senhor? Somos ainda racistas na relação cultural, linguística e social. É bem verdade, veja: se vemos um negro bem vestido, endinheirado, logo arriscamos "Ou é jogador de futebol ou traficante"; se nos aparece um assaltante branco, logo reclamamos "Ele até tinha uma boa aparência!". Escravizamos e somos escravizados até hoje. Trocamos a senzala pelos elevadores de serviço e trocamos a chibata por assédio moral. Só não trocamos a cor de quem serve os brancos puros brasileiros.
Não desejo entrar no mérito de quem escolhe mudar a fibra do seu cabelo e a feição de seu nariz para não inflamar os pitangys brasileiros (e porque não dizer cearenses?). Ponto para Vanessa da Mata que canta Joãozinho: "Moça de Joãozinho no cabelo, faz de conta no espelho. Abre a porta e vai para o asfalto, alisa a ponta do cabelo, só a ponta do cabelo. Corre quando começa a chover, olha só vai molhar e o cabelo encolher." E por que não dizer também, ponto para Caetano em Eu sou Neguinha! Assim como nos quilombos, o "povo negro" se avizinha nos morros do Rio e lá faz sua morada com os recursos que dispõem. Criam suas próprias leis, educam conforme foram educados pela maioria branca, lá na época da colonização, lembram? E os barracos que caíram, hoje transformados em moradia e lar, aos seus modos, foram entregues por homens brancos na época das eleições. E acusam os quilombolas de ocupação irregular! Ganho meu barraco e faço o quê? Assento ele nas ruas da Barra da Tijuca? Não, é melhor morar nas curvas do morro onde eles são a maioria. Juntos, podem descer do morro e pegar um pouco dos tupi-holandeses pra si. Lá emcima do morro, descansam a noite pensando tal como Zumbi a espera de Domingos Jorge Velho.

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